segunda-feira, 19 de janeiro de 2009

Aprendendo a ser igreja com história da Bossa Nova

Tenho uma amiga a quem prezo muito chamada Silvia Marcondes. Ela é uma daquelas cariocas bem nascidas, educada em colégio inglês, criada em mansões, politizada, capaz de discutir sobre quase qualquer tema que a conversa exigir.

Filha de Enio Silveira (um magnata que publicava livros comunistas no Rio de Janeiro em pleno auge da ditadura militar) Silvia cansou de me contar como viu a Bossa Nova nascer no piano que ornamentava a sala de sua casa. Não, seus pais não eram músicos e nem seus irmãos. O piano era uma cortesia que o senhor Enio preparava para receber amigos como Antônio Carlos Jobim, Vinicius de Moraes, João Gilberto, Baden Powell, entre outros "jovens" talentos.

Isso aconteceu no final da década de 50, exatamente quando um grupo de amigos cansados da pobreza cultural da época começaram a compor música com temática brasileira inspirada no jazz norte americano.

Eles eram em sua maioria jovens da classe A e B, que viviam em apartamentos não raras vezes sustentados pelos pais. Exceto pelas ocasiões em que se encontravam na mansão onde morava minha amiga Silvia, suas canções eram entoadas bem baixinho, em seus apartamentos, para grupos de cinco ou seis amigos. Daí o jeitão de cantar sussurrando, que apareceu logo na primeira gravação do "Desafinado" João Gilberto. O que no início aparentava ser uma limitação acabou se tornando o charme da Bossa, e uma identidade que acabou conquistando o mundo.

Alguns anos atrás, eu conversava com alguns irmãos sobre a necessidade ou não dos templos, uma vez que sabemos que Jesus e os primeiros discípulos não dispunham de uma estrutura física para se reunirem.

Eles não tinham um lugar para chamar de "igreja", por isso qualquer lugar em que se encontrassem acabava se tornando uma "igreja" (na concepção moderna e mais vulgar da palavra). Na prática, eles mesmos ERAM a igreja, e levavam isso muito a sério. A ponto de morrerem por sua fé.

O livro de Atos dos Apóstolos (que poderia muito bem chamar-se Atos do Espírito Santo) nos ensina que a igreja reunía-se nas casas dos fiéis. Mas muito longe do que cogitam alguns, esta não foi uma prática cultural apenas, ou fruto da perseguição (que na verdade surgiu depois), mas uma resposta positiva à ordem expressa do próprio Jesus, registrada em Mateus 10:11

"E, em qualquer cidade ou aldeia em que entrardes, procurai saber quem nela seja digno, e hospedai-vos aí, até que vos retireis."

A estratégia dada pelo próprio mestre não envolvia grandes cruzadas evangelísticas, nem apelos ao arrependimento das multidões. Ela era simples. "Procurem casas de pessoas dignas, e fiquem ali ensinando elas".

Fácil, não?

Mas numa dessas ocasiões fui inquirido por um irmãozinho nos seguintes termos. "Hoje nós que vivemos nos grandes centros urbanos, não temos tanta privacidade assim. Nossos apartamentos são pequenos para reuniões caseiras, e não é possível nem mesmo cantar um hino em voz alta que os vizinhos já reclamam. Orar em línguas então, nem me fale..."

Nesse momento eu me lembrei de minha amiga Silvia Marcondes e da turma da Bossa Nova.

Se o apartamento não comportava uma platéia de 20 pessoas, eles reuniam cinco. Se não podiam fazer barulho, eles cantavam baixinho. Não é à toa que tinham o respeito e admiração da alta sociedade carioca (que convivia nos mesmos prédios que eles). Não vou entrar no mérito aqui, mas será que temos o respeito dos vizinhos de nossos "templos"? Ou é melhor nos isolarmos em nossos feudos cristãos a fim de termos um pouco de privacidade e "louvarmos" a Deus como nos convém?

Gosto muito da versão da Sociedade Bíblica Britânica para Colossenses 3:16

"A palavra de Cristo habite em vós ricamente, em toda a sabedoria, instruindo e admoestando-vos uns aos outros com salmos, hinos e cânticos espirituais, com gratidão louvando a Deus em vossos corações."

Uma leitura mais atenta nos revela que os salmos, hinos e cânticos espirituais não necessitam estar em nossos lábios (muito menos do outro lado da parede, impedindo o vizinho de assistir a novela ou o Fantástico), mas sim em nossos corações.

A Bossa Nova ganhou o mundo com um sussurro carregado de emoção.

Com toda sinceridade, creio que o evangelho tem muito mais a acrescentar. Depende de nós crermos nele, e obedecermos ao nosso Senhor, Jesus Cristo.

Paz a todos.

5 comentários:

  1. Uia! Curti o blog e vou acompanhar. Também escrevo num blog, o Renovidade, algumas vezes textos relacionados a espiritualidades. Um abraço.

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  2. Gostei do seu blog, mano. Interessantíssimo saber um pouco mais sobre o fenômeno Bossa Nova, do qual sou apaixonado.

    A diferença entre a Bossa Nova e os cristãos está na meta. Os jovens da década de 50 não queriam nem sair de casa para não interferirem na vida alheia, e com isso, ganharam o mundo.

    Os cristãos querem interferir na vida alheia e querem ganhar o mundo, mas não conseguem sair nem de dentro de casa.

    Virei seu seguidor!

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  3. Wow! Gostei do comentário do Rodrigo:

    "A diferença entre a Bossa Nova e os cristãos está na meta. Os jovens da década de 50 não queriam nem sair de casa para não interferirem na vida alheia, e com isso, ganharam o mundo.

    Os cristãos querem interferir na vida alheia e querem ganhar o mundo, mas não conseguem sair nem de dentro de casa."

    É a pura realidade... infelizmente =/

    Muito bom o blog, Gian! Continue postando, estarei sempre por aqui!
    Abraço!

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  4. Boa Gian,

    falou de como a igreja deve ser e ainda deu uma lição de história, rs

    vou acompanhar sempre o blog,
    forte abraço

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  5. E os vizinhos querendo processar as Igrejas por conta do barulho ensurdecedor?! Um bando de maus educados incapazes de perceber a agonia de quem deseja ter um pouco de descanso ou conversar um pouco com a família.
    E fazem isso usando a desculpa esfarrapada de que seria para adoração a Deus! Bastaria avaliar se entre as desavenças causadas pelos transtornos com os vizinhos e um culto sem barulho, qual dos dois Deus escolheria.
    Assim com existe a pausa na música existe o momento de silêncio no culto. Resta saber quais adoradores são capazes de ficar mais de trinta segundos em silêncio e quieto aguardando Deus falar.
    Sei que pode parecer idiotice essa coisa de aguardar Deus falar...Até porque a maioria dos adoradores quer falar com Deus e isso não tem nada a ver com Deus falar. Para muitos Deus tem de ficar quietinho, ouvindo as suas adoraçõescomo moeda de troca, e por conta disso, se virar para atender as suas necessidades, já que estão pagando com o "louvor".
    Dc. Henri - Membro da OBBH.

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